Entrevista: Vera Jardim
Música, professores
Educação musical passa a ser obrigatória na Educação Básica. Mas, afinal, que ganhos isso traz para a formação das crianças? - Por Ana Vasconcelos
Findos os três anos para as escolas adaptarem o conteúdo de música ao seu currículo, a partir de 2011 a educação musical na Educação Básica passa a ser obrigatória. O projeto foi sancionado pelo Governo Federal em 2008 e entrou em vigor este ano. "A legislação estabelece que o aluno deverá ter acesso às linguagens artísticas ao longo do processo de escolarização, de acordo com o projeto pedagógico da escola, e conforme as condições, necessidades e recursos locais, incluindo a disponibilidade de profissionais capacitados", explica Vera Jardim, especialista em educação musical, que nos concedeu a entrevista a seguir.
Qual a importância da educação musical no currículo escolar?
No plano individual a educação em música torna consciente o potencial cognitivo, físico, criativo, afetivo e estético. No plano coletivo, propicia práticas fundadas no respeito mútuo e no convívio social, como a cooperação, a participação adequada e a importância fundamental de cada parte de um todo.
"O aluno deverá ter acesso às linguagens artísticas ao longo do processo de escolarização, de acordo com o projeto da escola."
Não, até porque a legislação estabelece que o aluno deverá ter acesso às linguagens artísticas - Música, Artes Plásticas, Dança e Teatro - ao longo do processo de escolarização, no momento em que a escola julgar adequado. Então, esse processo está sendo feito de modo lento.
Que benefícios já foram percebidos nos alunos de escolas que ensinam música?
Atenção, concentração, melhora na coordenação motora geral, aprimoramento das percepções, desenvolvimento do raciocínio e da linguagem (fala), socialização e sociabilidade são os benefícios mais citados, observados nos alunos que participam regularmente das aulas de música.
Que conteúdos se pode ensinar?
Eu penso que todos os conteúdos podem ser ensinados, sem restrição. O que as abordagens atuais procuram enfatizar é que é preciso privilegiar o fazer musical, e não concentrar-se nos conteúdos formais, teóricos ou históricos. Isso significa permitir que o aluno construa, por meio de suas experiências e vivências musicais, os nexos da linguagem musical, levando-o a compreender, depois, a formalização dessa forma de expressão.
Como adaptar a educação musical a alunos com deficiência auditiva?
A música é generosa e proporciona uma gama de possibilidades para a sua prática. Se há dificuldade motora fina ou digital, podemos usar instrumentos que trabalham a coordenação global, como os instrumentos de percussão, por exemplo. Se há impedimento motor, troca-se a prática instrumental pelo canto. No caso de problemas auditivos, um exemplo clássico é Beethoven, que mesmo acometido com uma surdez total, continuou seu trabalho de músico, de modo magistral.
O som, elemento essencial da música, é um fenômeno físico, percebido não apenas pela audição, mas também pelo tato, portanto adequa-se àqueles que se utilizam da linguagem visual-motora. É possível trabalhar outras formas de ouvir: ouvir com o corpo, ouvir com o intelecto, e isso inclui todas as pessoas, não apenas aquelas com limitações auditivas.
Quais as melhores práticas em educação musical nas escolas?
Se as circunstâncias são favoráveis ao trabalho instrumental, não há porque não ser feito. Se na escola não existem instrumentos musicais tradicionais, podemos usar a voz, a percussão corporal ou inventar novos meios de se obter sons e fazermos música.
Na prática, como o professor pode trabalhar música sem instrumento?
A música é maior que um instrumento musical. É preciso considerar que o primeiro "instrumento" de expressão do ser é o "corpo", e ele é o veículo da musicalidade. Por isso é necessário ampliar o conceito de prática privilegiando os elementos básicos e primitivos da música a partir dos quais ela pode ser estruturada. Ao privilegiar os elementos essenciais trazemos a música ao alcance de todos. Podemos produzir sons, colocá-los numa sequência, sobrepô-los, organizá- los, desorganizá-los - manipular os elementos.
Dessa forma resgatamos a relação do indivíduo com a linguagem musical e os despertamos para os sons e silêncios, fazendo-os observar toda a gama sonora a partir dos sons produzidos pelo próprio corpo, pela natureza, no espaço urbano e no ambiente onde o homem é o produtor e compositor.
Vera Jardim é musicista e licenciada em Música, pedagoga, psicopedagoga, mestre e doutora em Educação: História, Política, Sociedade, atua na área da Educação Musical desde a educação infantil até a pós-graduação, desenvolveu projetos culturais, pedagógicos e de formação de professores e atualmente é docente nos cursos de Pedagogia e Licenciatura em Música.
Fonte: http://revistaguiafundamental.uol.com.br/professores-atividades
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