quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Rumo à democracia

Você sabe o que significa uma gestão democrática?




Um dos termos que mais tem acompanhado a palavra gestão nos últimos tempos é o adjetivo "democrática". Mas qual é o verdadeiro significado de administrar democraticamente uma instituição de ensino? Na história da Educação, a reivindicação organizada dos profissionais para participar das discussões que envolvem seu trabalho e sua carreira é bem recente. Ela ganhou ênfase depois de movimentos como o das Diretas Já, em 1984, e o Dia D da Educação (uma série de debates promovidos por universidades, sindicatos e associações de educadores entre 1983 e 1988). "Os diretores das escolas públicas exerciam a função como se fossem proprietários do estabelecimento. A cultura do autoritarismo foi cultivada desde a Proclamação da República até a ditadura militar e só começou a se romper nos anos 1980", explica Dinair Leal da Hora, professora da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) e autora do livro Gestão Educacional Democrática.

Na política, a volta gradual das eleições diretas deu voz ao povo. Nas escolas, os professores passaram a exigir a participação nas decisões sobre questões pedagógicas.  A luta reverberou no Congresso Nacional e a Constituição de 1988 foi a primeira a usar a expressão "gestão democrática do ensino público", reforçada mais tarde no texto da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), de 1996. Nenhuma das duas normas, porém, resolveu um problema que permanece até hoje: afinal, como fazer a gestão democrática? Basta consultar a equipe sobre as decisões internas? Abrir os portões para a comunidade é suficiente? Promover a f lexibilização do currículo? Ou será a combinação de tudo isso e mais alguma coisa?

O conhecimento sobre a gestão democrática está sendo construído diariamente na atuação de cada gestor com sua equipe. Há o consenso de que, para gerar um ambiente no qual todos atuem para alcançar o objetivo comum de garantir a aprendizagem, os diretores precisam desenvolver algumas competências, que são simples na definição, mas complexas na execução, como saber ouvir e levar em consideração ideias, opiniões e posicionamentos divergentes.

Essa é uma habilidade imprescindível para garantir uma gestão participativa que supere o paradigma autoritário e leve a construção coletiva de soluções eficazes para todas as áreas da gestão da escola: a pedagógica, a administrativa, a de recursos humanos, da comunidade etc.


Criar esse ambiente democrático, que une participação e ação, é um dos principais desafios da Educação contemporânea e um dos caminhos necessários na busca pela qualidade do ensino.
"Na prática, o que existe na maioria das escolas brasileiras é uma gestão compartimentada. 

Um pequeno grupo decide e a maioria executa", afirma Dinair. Construir uma gestão  democrática exige tempo e planejamento e dá mais trabalho do que simplesmente agir de forma diretiva. Contudo, os ganhos são enormes quando as decisões sobre os gastos, a  montagem do projeto pedagógico e os instrumentos de avaliação, entre outros, são  compartilhados e a comunidade e a equipe se sentem, de fato, parte da escola. Assim o democrático deixa de ser adjetivo para se tornar prática.

Quer saber mais?
Bibliografia
Gestão Educacional Democrática, Dinair Leal da Hora, 112 págs., Ed. Alínea, ww.atomoealinea.com.br, tel. (19) 3232-0047, 25 reais
Gestão Democrática: Refl exões e Práticas do/no Cotidiano Escolar, Wendel Freire (org.), 188 págs., Ed. Wak, www.wakeditora.com.br, tel. (21) 3208-6095, 30 reais


Publicado em NOVA ESCOLAEdição 004, Outubro/Novembro 2009,



sexta-feira, 2 de setembro de 2011

MEC vai distribuir tablets para alunos de escolas públicas em 2012

01 de setembro de 2011 20h29 atualizado às 20h32




O Ministro da Educação, Fernando Haddad, divulgou nesta quinta-feira que o governo vai distribuir tablets a escolas públicas a partir do próximo ano. A informação foi confirmada durante palestra a editores de livros escolares, na 15ª Bienal do Livro. O objetivo, segundo o ministro, é universalizar o acesso dos alunos à tecnologia.
 
Haddad afirmou que o edital para a compra dos equipamentos será publicado ainda este ano. "Nós estamos investindo em conteúdos digitais educacionais. O MEC investiu, só no último período, R$ 70 milhões em produção de conteúdos digitais.
 
Temos portais importantes, como o Portal do Professor e o Portal Domínio Público. São 13 mil objetos educacionais digitais disponíveis, cobrindo quase toda a grade do ensino médio e boa parte do ensino fundamental."
 
Segundo Haddad, o ministério está em processo de transformação. "Precisamos, agora, dar um salto, com os tablets. Mas temos que fazer isso de maneira a fortalecer a indústria, os autores, as editoras, para que não venhamos a sofrer um problema de sustentabilidade, com a questão da pirataria", disse.
Haddad não soube precisar o volume de tablets que será comprado pelo MEC, mas disse que estaria na casa das "centenas de milhares". Ele destacou que a iniciativa está sendo executada em parceria com o Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT).

"O MEC, neste ano, já publica o edital de tablets, com produção local, totalmente desonerado de impostos, com aval do Ministério da Fazenda. A ordem de grandeza do MEC é de centenas de milhares. Em 2012, já haverá uma escala razoável na distribuição de tablets", concluiu.

Fonte: www.terra.com.br/educação

domingo, 24 de julho de 2011

Educação musical passa a ser obrigatória na Educação Básica. Mas, afinal, que ganhos isso traz para a formação das crianças? - Por Ana Vasconcelos

 

Entrevista: Vera Jardim

Música, professores


Educação musical passa a ser obrigatória na Educação Básica. Mas, afinal, que ganhos isso traz para a formação das crianças? - Por Ana Vasconcelos

Findos os três anos para as escolas adaptarem o conteúdo de música ao seu currículo, a partir de 2011 a educação musical na Educação Básica passa a ser obrigatória. O projeto foi sancionado pelo Governo Federal em 2008 e entrou em vigor este ano. "A legislação estabelece que o aluno deverá ter acesso às linguagens artísticas ao longo do processo de escolarização, de acordo com o projeto pedagógico da escola, e conforme as condições, necessidades e recursos locais, incluindo a disponibilidade de profissionais capacitados", explica Vera Jardim, especialista em educação musical, que nos concedeu a entrevista a seguir.

Qual a importância da educação musical no currículo escolar?
No plano individual a educação em música torna consciente o potencial cognitivo, físico, criativo, afetivo e estético. No plano coletivo, propicia práticas fundadas no respeito mútuo e no convívio social, como a cooperação, a participação adequada e a importância fundamental de cada parte de um todo.


"O aluno deverá ter acesso às linguagens artísticas ao longo do processo de escolarização, de acordo com o projeto da escola."


Houve adesão imediata das escolas à lei sancionada em 2008?
Não, até porque a legislação estabelece que o aluno deverá ter acesso às linguagens artísticas - Música, Artes Plásticas, Dança e Teatro - ao longo do processo de escolarização, no momento em que a escola julgar adequado. Então, esse processo está sendo feito de modo lento.


Que benefícios já foram percebidos nos alunos de escolas que ensinam música?
Atenção, concentração, melhora na coordenação motora geral, aprimoramento das percepções, desenvolvimento do raciocínio e da linguagem (fala), socialização e sociabilidade são os benefícios mais citados, observados nos alunos que participam regularmente das aulas de música.


Que conteúdos se pode ensinar?
Eu penso que todos os conteúdos podem ser ensinados, sem restrição. O que as abordagens atuais procuram enfatizar é que é preciso privilegiar o fazer musical, e não concentrar-se nos conteúdos formais, teóricos ou históricos. Isso significa permitir que o aluno construa, por meio de suas experiências e vivências musicais, os nexos da linguagem musical, levando-o a compreender, depois, a formalização dessa forma de expressão.


Como adaptar a educação musical a alunos com deficiência auditiva?
A música é generosa e proporciona uma gama de possibilidades para a sua prática. Se há dificuldade motora fina ou digital, podemos usar instrumentos que trabalham a coordenação global, como os instrumentos de percussão, por exemplo. Se há impedimento motor, troca-se a prática instrumental pelo canto. No caso de problemas auditivos, um exemplo clássico é Beethoven, que mesmo acometido com uma surdez total, continuou seu trabalho de músico, de modo magistral.
O som, elemento essencial da música, é um fenômeno físico, percebido não apenas pela audição, mas também pelo tato, portanto adequa-se àqueles que se utilizam da linguagem visual-motora. É possível trabalhar outras formas de ouvir: ouvir com o corpo, ouvir com o intelecto, e isso inclui todas as pessoas, não apenas aquelas com limitações auditivas.


Quais as melhores práticas em educação musical nas escolas?
Se as circunstâncias são favoráveis ao trabalho instrumental, não há porque não ser feito. Se na escola não existem instrumentos musicais tradicionais, podemos usar a voz, a percussão corporal ou inventar novos meios de se obter sons e fazermos música.


Na prática, como o professor pode trabalhar música sem instrumento?
A música é maior que um instrumento musical. É preciso considerar que o primeiro "instrumento" de expressão do ser é o "corpo", e ele é o veículo da musicalidade. Por isso é necessário ampliar o conceito de prática privilegiando os elementos básicos e primitivos da música a partir dos quais ela pode ser estruturada. Ao privilegiar os elementos essenciais trazemos a música ao alcance de todos. Podemos produzir sons, colocá-los numa sequência, sobrepô-los, organizá- los, desorganizá-los - manipular os elementos.
Dessa forma resgatamos a relação do indivíduo com a linguagem musical e os despertamos para os sons e silêncios, fazendo-os observar toda a gama sonora a partir dos sons produzidos pelo próprio corpo, pela natureza, no espaço urbano e no ambiente onde o homem é o produtor e compositor.


Vera Jardim é musicista e licenciada em Música, pedagoga, psicopedagoga, mestre e doutora em Educação: História, Política, Sociedade, atua na área da Educação Musical desde a educação infantil até a pós-graduação, desenvolveu projetos culturais, pedagógicos e de formação de professores e atualmente é docente nos cursos de Pedagogia e Licenciatura em Música.

Fonte: http://revistaguiafundamental.uol.com.br/professores-atividades

sábado, 23 de julho de 2011

Conclusão da série: Uma escola pública de qualidade - Por Celso Antunes





Com esta breve conclusão, encerramos a série de artigos que escrevemos, destacando o que vimos e o que lemos sobre escolas públicas brasileiras com excelente qualidade, e que simbolizam verdadeiras “ilhas de exceção” no amplo contexto de nossas escolas, muitas delas extremamente distantes do que sonhamos e das condições mínimas que costumam caracterizar centros de ensino em muitos outros países.
 
Consola-nos, de certa forma, o pensamento do historiador inglês Arnold J. Toynbee, que afirmou com propriedade que “não importa a dispersão dos caminhos, enquanto existir identidade na procura”.
 
Tais palavras, bem mais que os textos deste blog, expressam o sentimento que deve unir a escola brasileira em seu salto em direção a uma qualidade maior.
Não existe única receita e os caminhos são múltiplos, mas todos eles encontram ponto de união na certeza de que:·  O professor é figura essencial, mas não o único elemento importante na construção de uma aprendizagem consciente.
·  O aluno, sua cultura e o que traz à escola necessitam compor o eixo central do processo de aprendizagem.
·  Uma gestão democrática, arrojada e eficiente é elo de importante estímulo a atores e parceiros coadjuvantes no processo de aprendizagem.
·  Nenhuma prática isolada dos fins específicos da aprendizagem pode gerar resultados significativos para a melhoria do desempenho do aluno.
·  O envolvimento familiar pleno e irrestrito constitui caminho sem retorno para a melhor qualidade da aprendizagem dos alunos.
·  Um ambiente de ensino pode ter recursos financeiros escassos, desde que exista um mínimo de conforto e segurança, que representa inalienável direito de toda criança, de todo aluno.
Como procuramos mostrar neste texto que a transformação de uma escola comum em uma escola de excelente qualidade não envolve despesas ou sacrifícios, mas sólida e coerente vontade de uma equipe, amparada por essa meta significativa.
 
O Brasil venceu com esforço e com indiscutível mérito a grande batalha da exclusão escolar, colocando nas salas de aula verdadeira multidão de alunos que, décadas atrás, não imaginavam essa possibilidade.
 
Vencida a batalha quantitativa, é chegada a hora de iniciar, com ousadia e sem temor, o gigantesco e imprescindível esforço pela qualidade.




Celso Antunes: Psicopedagogo, professor é bacharel e licenciado em Geografia e mestre em Ciências Humanas pela Universidade de São Paulo, especialista em Inteligência e Cognição.



quarta-feira, 20 de julho de 2011

Consulte e compare o Ideb das escolas até a 4ª série

Ferramenta criada pelo iG mostra os resultados de português e matemática e a taxa de aprovação de todas instituições brasileiras





Desde 2007, todas as escolas brasileiras da rede pública recebem uma nota do Ministério da Educação formada a partir do desempenho dos alunos em provas de português e matemática – a Prova Brasil – e da quantidade de alunos aprovados em cada série. O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) tem a pretensão de medir a qualidade da educação brasileira. O resultado de todas as instituições do País nesta avaliação em 2009 pode ser conferido em ferramenta criada pelo iG.

Para consultar a taxa de aprovação em cada série inicial (até a 4ª) e a nota dos estudantes na Prova Brasil em uma escola é preciso escrever o nome da instituição (sem acentos) no campo à esquerda do quadro. A ferramenta apresenta os resultados e traz ainda a evolução da nota do Ideb nestas séries desde 2005. Para comparar as notas com as de outras escola, basta preencher o campo no lado direito da tabela com o nome da instituição que deseja fazer a comparação. A ferramenta apresenta os resultados das duas escolas, com uma marcação em verde dos melhores desempenhos.

Copie e cole este link para comparar a nota das escolas de todo o país.


http://ultimosegundo.ig.com.br/educacao/consulte+e+compare+o+ideb+das+escolas+nos+anos+iniciais/n1237758250441.html


O Ideb apresenta metas para cada escola, rede, município, Estado e para todo o país. Cada instituição ou rede tem uma nota a ser atingida, elaborada de acordo com os próprios desafios. Em 2009, numa escala de 1 a 10, o MEC previa uma meta para a média do País nos anos iniciais de 4,2. O resultado alcançado foi de 4,6. Para as séries finais, era esperado o Ideb de 3,9 no Brasil. A média foi de 4,0. O objetivo do governo brasileiro é atingir a meta de 6,0 nos anos iniciais em 2022. Para os anos finais, a meta é de 5,5 no mesmo ano. Com este resultado, o Brasil alcança os níveis de desempenho dos países desenvolvidos.
 
 

segunda-feira, 18 de julho de 2011

Educadores contestam artigo de Gustavo Ioschpe, da revista “Veja”

Educadores: “Que bom que os Sindicatos de Trabalhadores da Educação preocupam os sacerdotes da privataria e seus braços ideológicos!”

Vários educadores divulgaram texto com críticas ao artigo de Gustavo Ioschpe (“Hora de Peitar os Sindicatos de Professores”), veiculado no site da revista “Veja”.




Vários meios de comunicação utilizam-se de seu poder unilateral para realizar ataques truculentos a quem ousa contrariar seus interesses. O artigo de Gustavo Ioschpe, publicado na edição de 12 de abril de 2011 da Revista Veja (campeã disparada do pensamento ultraconservador no Brasil), não apenas confirma a opção deliberada da Revista em atuar como agência de desinformação — trafegando interesses privados mal disfarçados de interesse de todos —, como mostra o exercício dessa opção pela sua mais degradada face, cujo nível, deploravelmente baixo, começa pelo título — “hora de peitar os sindicatos”. Com a arrogância que o caracteriza como aprendiz de escriba, desde o início de seu texto, o autor considera patrulha ideológica qualquer discordância em relação às suas parvoíces.

Na década de 1960, Pier Paolo Pasolini escrevia que o fascismo arranhou a Itália, mas o monopólio da mídia a arruinou. Cinquenta anos depois, a história lhe deu inteira razão. O mesmo poderia ser dito a respeito das ditaduras e reiterados golpes que violentaram vidas, saquearam o Brasil, enquanto o monopólio privado da mídia o arruinava e o arruína. Com efeito, os barões da mídia, ao mesmo tempo em que esbravejam pela liberdade de imprensa, usam todo o seu poder para impedir qualquer medida de regulação que contrarie seus interesses, como no caso exemplar da sua oposição à regulamentação da profissão de jornalista. Os áulicos e acólitos dessa corte fazem-lhe coro.

O que trafega nessa grande mídia, no mais das vezes, são artigos de prepostos da privataria, cheios de clichês adornados de cientificismo para desqualificar, criminalizar e jogar a sociedade contra os movimentos sociais defensores dos direitos que lhes são usurpados, especialmente contra os sindicatos que, num contexto de relações de superexploração e intensificação do trabalho, lutam para resguardar minimamente os interesses dos trabalhadores.

Os artigos do senhor Gustavo Ioschpe costumam ser exemplos constrangedores dessa “vocação”. Os argumentos que utiliza no artigo recentemente publicado impressionam, seja pela tamanha tacanhez e analfabetismo cívico e social, seja pelo descomunal cinismo diante de uma categoria com os maiores índices de doenças provenientes da superintensificação das condições precárias de trabalho às quais se submete.

Um dos argumentos fundamentais de Ioschpe é explicitado na seguinte afirmação:
Cada vez mais a pesquisa demonstra que aquilo que é bom para o aluno na verdade faz com que o professor tenha que trabalhar mais, passar mais dever de casa, mais testes, ocupar de forma mais criativa o tempo de sala de aula, aprofundar-se no assunto que leciona. E aquilo que é bom para o professor — aulas mais curtas, maior salário, mais férias, maior estabilidade no emprego para montar seu plano de aula e faltar ao trabalho quando for necessário — é irrelevante ou até maléfico aos alunos.


A partir desse raciocínio de lógica formal, feito às canhas, tira duas conclusões bizarras. A primeira refere-se à atribuição do poder dos sindicatos ao seu suposto conflito de interesses com “a sociedade representada por seus filhos/alunos”: “É por haver esse potencial conflito de interesses entre a sociedade representada por seus filhos/alunos e os professores e funcionários da educação que o papel do sindicato vem ganhando importância e que os sindicatos são tão ativos (…)”.

A segunda, linearmente vinculada à anterior, tenta estabelecer a existência de uma nefasta influência dos sindicatos sobre o desempenho dos alunos. Nesse caso, apoia-se em pesquisa do alemão Ludger Wossmann, fazendo um empobrecido recorte das suas conclusões, de modo a lhe permitir afirmar que “naquelas escolas em que os sindicatos têm forte impacto na determinação do currículo os alunos têm desempenho significativamente pior”.

Os signatários deste breve texto analisam, há mais de dois anos, a agenda de trabalho de quarenta e duas entidades sindicais afiladas à Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) e acompanham ou atuam como afiliados nas ações do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (ANDES-SN). O que extraímos dessas agendas de ação dos sindicatos é, em tudo, contrário às delirantes e deletérias conclusões do articulista.

Em vez de citar pesquisas de segunda mão, para mostrar erudição e cientificidade em seu argumento, deveria apreender o que demanda uma análise efetivamente científica da realidade. Isso implicaria que de fato pesquisasse sobre a ação sindical docente e sobre os processos econômico-sociais e as políticas públicas com os quais se confronta e dialoga e, a partir dos quais, se constitui. Não imaginamos que um filho de banqueiros ignore que os bancos, os industriais, os latifundiários, a grande mídia têm suas federações ou organizações que fazem lobbies para ter as benesses do fundo público.

Um efetivo envolvimento com as pesquisas e com os processos sociais permitiria ao autor perceber onde se situam os verdadeiros antagonismos e “descobrir” que os sindicatos não se criaram puxando-se de um atoleiro pelos cabelos — à moda do Barão de Münchhausen —, autoinventando-se, muito menos confrontando-se com os alunos e seus pais.

As análises que não levam isso em conta, que se inventam puxando-se pelos cabelos a partir dos atoleiros dos próprios interesses, não conseguem apreender minimamente os sentidos dessa realidade e resultam na sequência constrangedora de banalidades e de afirmações levianas como as expostas por Ioschpe.

Uma das mais gritantes é relativa ao entendimento do autor sobre quem representa a sociedade no processo educativo. É forçoso lembrar ao douto analista que os professores, a direção da escola e os sindicatos também pertencem à sociedade e não são filhos de banqueiros nem se locupletam com vantagens provenientes dos donos do poder.

Ademais, valeria ao articulista inscrever-se num curso de história social, política e econômica para aprender uma elementar lição: o sindicato faz parte do que define a legalidade formal de uma sociedade capitalista, mas o ultraconservadorismo da revista na qual escreve e com a qual se identifica já não o reconhece, em tempos de vingança do capital contra os trabalhadores.

Cabe ressaltar que todos os trocadilhos e as afirmações enfáticas produzidos
pelo articulista não conseguem encobrir os interesses privados que defende e que afetam destrutivamente o sentido e o direito da população à educação básica pública, universal, gratuita, laica e unitária.

Ao contrário do que afirma a respeito da influência dos sindicatos nos
currículos, o que está mediocrizando a educação básica pública é a ingerência de institutos privados, bancos e financistas do agronegócio, que infestam os conteúdos escolares com cartilhas que empobrecem o processo de formação humana, impregnando-o com o discurso único do mercado – o da educação de empreendedores. E que, muitas vezes, com a anuência de grande parte das administrações públicas, retiram do professor a autoridade e a autonomia sobre o que ensinar e como ensinar dentro do projeto pedagógico que, por direito, eles constroem, coletivamente, a partir de sua realidade.

O que o Sr. Ioschpe não mostra, descaradamente, é que esses institutos privados não buscam a educação pública de qualidade e nem atender o interesse dos pais e alunos, mas lucrar com a venda de pacotes de ensino, de metodologias pasteurizadas e de assessorias.

Por fim, é de um cinismo e desfaçatez vergonhosa a caricatura que o articulista faz da luta docente por condições de trabalho e salário dignos. Caberia perguntar se o douto senhor estaria tranquilo com um salário-base de R$ 1.487,97, por quarenta horas semanais, para lecionar em até 10 turmas de cinquenta jovens. O desafio é: em vez de “peitar os sindicatos”, convide a sua turma para trabalhar 40 horas e acumular essa “fortuna” de salário básico. Ou, se preferir fazer um pouco mais, trabalhar em três turnos e em escolas diferentes. Provavelmente, esse piso para os docentes tem um valor bem menor que o que recebe o articulista para desqualificar e criminalizar, irresponsavelmente, uma instituição social que representa a maior parcela de trabalhadores no mundo.

Mas a preocupação do articulista e da revista que o acolhe pode ir aumentando, porque, quando o cinismo e a desfaçatez vão além da conta, ajudam aqueles que ainda não estão sindicalizados a entender que devem fazê-lo o mais rápido possível.

Gaudêncio Frigotto, Zacarias Gama e Eveline Algebaile são professores do programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas e Formação Humana da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (PPFH/UERJ).Vânia Cardoso da Mota é professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro e Colaboradora do PPFH/UERJ. Hélder Molina é educador, assessor sindical e doutorando do PPFH/UERJ.

terça-feira, 5 de julho de 2011

Os erros mais comuns do PPP - Segundo Paulo Padilha, do Instituto Paulo Freire.

Os erros mais comuns do PPP



Alguns descuidos no processo de elaboração do projeto político-pedagógico podem prejudicar sua eficácia e devem ser evitados:

- Comprar modelos prontos ou encomendar o PPP a consultores externos. "Se a própria comunidade escolar não participa da preparação do documento, não cria a ideia de pertencimento", diz Paulo Padilha, do Instituto Paulo Freire.

- Com o passar dos anos, revisitar o arquivo somente para enviá-lo à Secretaria de Educação sem analisar com profundidade as mudanças pelas quais a escola passou e as novas necessidades dos alunos.

- Deixar o PPP guardado em gavetas e em arquivos de computador. Ele deve ser acessível a todos.

- Ignorar os conflitos de ideias que surgem durante os debates. Eles devem ser considerados, e as decisões, votadas democraticamente.

- Confundir o PPP com relatórios de projetos institucionais - portfólios devem constar no documento, mas são apenas uma parte dele.


Paulo Roberto Padilha - Instituto Paulo Freire
Créditos para: Noemia Lopes noemia.lopes@abril.com.br

BIBLIOGRAFIA
Planejamento Dialógico: Como Construir o Projeto Político-Pedagógico da Escola
, Paulo Roberto Padilha,
160 págs., Ed. Cortez, tel. (11) 3611-9616, 28 reais
Planejamento: Projeto de Ensino-Aprendizagem e Projeto Político-Pedagógico, Celso dos Santos Vasconcellos, 208 pág., Ed. Libertad, tel. (11) 5062-8515, 40 reais
Projeto Político-Pedagógico: Construção e Implementação na Escola, Cássia Ravena Mulin de Assis Medel, 128 págs., Ed. Autores Associados, tel. (19) 3249-2800, 29 reais


Fonte: http://revistaescola.abril.com.br


segunda-feira, 4 de julho de 2011

Caminho para uma Escola Cidadã mais bela, prazerosa e aprendente - Paulo Roberto Padilha

 


Caminho para uma Escola Cidadã mais bela, prazerosa e aprendente - Paulo Roberto Padilha
 
O projeto político-pedagógico (PPP) da escola pode ser inicialmente entendido como um processo de mudança e de antecipação do futuro, que estabelece princípios, diretrizes e propostas de ação para melhor organizar, sistematizar e significar as atividades desenvolvidas pela escola como um todo. Sua dimensão político-pedagógica pressupõe uma construção participativa que envolve ativamente os diversos segmentos escolares. Ao desenvolvê-lo, as pessoas ressignificam suas experiências, refletem suas práticas, resgatam, reafirmam e atualizam valores, explicitam seus sonhos e utopias, demonstram seus saberes, dão sentido aos seus projetos individuais e coletivos, reafirmam suas identidades, estabelecem novas relações de convivência e indicam um horizonte de novos caminhos, possibilidades e propostas de ação. Este movimento visa à promoção da transformação necessária e desejada pelo coletivo escolar e comunitário. Nesse sentido, o projeto político-pedagógico é praxis, ou seja, ação humana transformadora, resultado de um planejamento dialógico, resistência e alternativa ao projeto de escola e de sociedade burocrático, centralizado e descendente. Ele é movimento de ação-reflexão-ação, que enfatiza o grau de influência que as decisões tomadas na escola exercem nos demais níveis educacionais.

Ao pensar e plantar o PPP – mais do que implementar ou implantar – as relações estabelecidas na escola podem resgatar a alegria a felicidade existente no espaço educacional, festejar o encontro das pessoas e dos grupos, multiplicar os espaços de trocas e de relações inter-transculturais (PADILHA, 1999-2002). Este projeto se caracteriza por ser eco-político-pedagógico: ética e estética, sustentabilidade e virtualidade – referências e princípios indispensáveis para a operacionalização, concretização do mesmo.


Na perspectiva da Escola Cidadã, a elaboração do projeto político-pedagógico deve começar pela reflexão sobre a prática para, em seguida, fundamentá-la. Mas isso só é possível se criarmos as condições concretas para a formação continuada do/a professor/a e de todos os segmentos escolares, tarefa dos governos responsáveis pelas respectivas redes ou sistemas de ensino e também da própria escola. Esta, ao iniciar a construção do seu projeto, inicia um processo de formação continuada da comunidade escolar, demanda que vai surgindo de forma mais evidente dada as características desse trabalho que por isso é, em si mesmo, político-pedagógico e formativo.


Aprende-se fazendo e, ao se fazer, aprende-se a (re)aprender. O conjunto destas (re)aprendizagens, reflexões, ações e relações, somado ao trabalho pedagógico, administrativo, financeiro e comunitário da escola – tudo registrado como resultado da leitura do mundo, deve ser traduzido na forma de princípios, diretrizes e propostas de ação. E isso nos possibilita estruturar o PPP da escola, bem como organizar ou reorganizar o seu currículo.
Por onde começar a construção do projeto político-pedagógico?


Transformar a experiência educativa em algo puramente técnico seria amesquinhar o caráter humano da formação da pessoa (Paulo Freire, 1997). O mesmo autor nos fala da importância do estímulo à curiosidade, imaginação, emoção, intuição do aluno e do professor, sempre associados à necessária rigorosidade da pesquisa científica. Nesse contexto, consideramos que vários são os caminhos para iniciar, na escola, a elaboração do seu projeto político-pedagógico. Optamos por oferecer um indicador que visa à (re)construção de uma escola mais bela, prazerosa e aprendente.


Quem gosta de freqüentar uma escola suja, feia, depredada, pichada, cheia de muros e de grades? Sentir-se bem na escola exige a preocupação constante com a sua estrutura física, com a conservação das suas dependências e dos diferentes espaços como o seu jardim, a sua horta, as suas possíveis áreas livres e esportivas para que alunos, professores e comunidade possam ocupá-las e freqüentá-las de forma lúdica, alegre, científica, pedagógica. Mas isso não basta.


Importância ainda maior devemos dar à qualidade e à beleza das relações pessoais, interpessoais e grupais que lá se estabelecem. Se a escola não conta com estes espaços de trocas e de relações, razão maior possui para que se dedique a reivindicá-los, a lutar politicamente por eles e, por conseguinte, a conquistá-los. Nenhuma mudança fundamental acontece gratuitamente, sem esforços, sem luta e sem conflito. Aí está também a dimensão política do ato educativo. Daí a necessidade do PPP, processo no qual registramos tais demandas, criando movimentos favoráveis ao alcance das mudanças desejadas. Necessidades e desejos que mobilizam a ação e o desenvolvimento de processos profundamente pedagógicos.


A Festa da Escola Cidadã como primeiro momento da “leitura do mundo”
Consideramos que “ensinar e aprender não podem dar-se fora da procura, fora da boniteza e da alegria” (FREIRE, 1997:160). Falar em Festa da Escola Cidadã significa isso: ousadia e enfrentamento do risco e a necessidade de evitarmos atitudes que possam diminuir o significado desta festa, da festa que é do povo, como se falar em festa significasse “apenas” um momento de lazer, ou de brincadeira, ou de “oba-oba”. Reiteramos: freirianamente falando, a realização da festa na escola traduz a incorporação da informalidade ao currículo. Daí a sua dimensão político-pedagógica ao significar, sobretudo, uma reflexão sócio-antropológica da realidade em que está inserida a escola.


A festa é o primeiro momento da “leitura do mundo” para a construção do projeto político-pedagógico da escola, conhecimento da realidade para nela intervirmos democrática e participativamente.


Encontramos os fundamentos desta proposta no conjunto de princípios políticos, filosóficos e pedagógicos desenvolvidos por Paulo Freire, nas várias Pedagogias que escreveu e que a tantos incentivou a escrever e a praticar.


A festa “é um evento excepcional, e o é assim exatamente porque rompe as lógicas do comum, mas esta peculiaridade subentende, no seu interior, muitas e profundas variáveis de sentido, de valores, de modalidades participativas” (GIACALONE, In: FLEURI, 1998:127). Ao realizarmos a festa na escola estaremos também colaborando para o reconhecimento da multiculturalidade. Esta, “torna-se intercultura quando as diferentes dimensões entram em relação: “colocam-se em jogo”. (Idem, 1998:135).


Algumas perguntas podem orientar o sempre indispensável registro da experiência da leitura do mundo via festa. Por exemplo, o que, com quem e como nos organizamos? Quais as nossas dificuldades e facilidades? O que não conseguimos fazer? Onde avançamos? Quais os conflitos, retrocessos, aprendizagens e ensinamentos observados? Quais as descobertas mais significativas da experiência, os êxitos, os problemas a enfrentar, as sensações, emoções e relações criadas e estabelecidas durante a realização das várias atividades da festa? O que deu mais prazer e mais medo? Como conseguimos superar as dificuldades e os problemas surgidos? Enfim, o que devemos fazer de novo e o que não vale à pena repetir?


Com estas e outras perguntas, estaremos reunindo elementos fundamentais para organizarmos a escrita, digamos, mais formal, do projeto político-pedagógico da escola e reunindo elementos concretos, contextualizados e, sobretudo, vivenciados pelos diversos segmentos escolares para melhor ressignificarmos o currículo escolar. Favoreceremos, assim, a aprendizagem dos alunos. Teremos em mãos as informações iniciais para a definição dos princípios, das diretrizes e das propostas de ação do nosso projeto de escola, de cidade, de sociedade e de mundo.
Insistimos: a escola precisa escrever a sua história, registrar a sua experiência de várias maneiras: por escrito, em vídeo, em áudio, através de fotografias, desenhos e outras formas criativas de registro. Assim, terá mais elementos para pensar o futuro e, então, escrever o seu projeto político-pedagógico, a sua proposta pedagógica, consubstanciados em dados concretos da realidade, que tenham por referência as experiências locais da comunidade escolar, comparadas e relacionadas ao contexto planetário em que vive.


Para operacionalizar a leitura do mundo, na perspectiva da Festa da Escola Cidadã, sugerimos alguns possíveis passos:


1º - Discutir com a comunidade escolar o significado desta Festa.
2º - Constituir uma Comissão que organize e coordene este processo na escola, em sintonia com os outros colegiados escolares.
3º - Criar espaços para que a toda a comunidade escolar possa decidir sobre como será a festa em todas as suas dimensões.
4º - Definir responsabilidades, atribuições, cronograma das ações e oferecer formação aos membros da Comissão da Festa para melhor qualificar a sua atuação na mesma.
5º - Socializar a experiência na própria escola, com outras escolas e ampliar esta troca em relação ao nível interescolar, municipal etc.
6º - Ampliar a comunicação na escola e dar retorno permanente à comunidade escolar sobre o resultado dos trabalhos e das atividades desenvolvidos, inserindo-a na avaliação dialógica deste processo.
7º - Analisar e interpretar permanentemente os resultados parciais da leitura do mundo, em especial, nas suas dimensões social, política, ambiental, econômica - enfim, cultural, realizando a transposição do resultado deste trabalho para o Marco Referencial do PPP da escola, no qual se registram a visão de mundo da comunidade escolar, suas utopias e os seus sonhos de uma escola melhor.
8º - Atualizar o direcionamento do olhar em relação a determinados enfoques e dimensões que se deseja pesquisar e/ou aprofundar, tornando a festa um evento permanentemente atualizado em suas linguagens e atividades.


São vários os formatos possíveis de realizar a Festa da Escola Cidadã. Cada unidade escolar tem a possibilidade de escolher o seu. O importante é sempre nos perguntarmos sobre como podemos manter, melhorar e ampliar o processo de leitura do mundo, que também não se limita à realização da festa. Nesse sentido, algumas questões são sempre recomendadas. Por exemplo: como ampliar a leitura do mundo? Quais as características das dimensões administrativa, pedagógica, financeira, social e cultural da escola e da comunidade? Os olhares dos vários segmentos escolares estão sendo contemplados? Quais perguntas já nos fizemos e quais ainda não foram feitas? As respostas às nossas perguntas são resultados da maioria dos sujeitos escolares ou resultam de uma consulta mínima, pouco representativa se comparada à amplitude da relação entre escola e comunidade?


O PPP da escola, partindo dessa “leitura do mundo” e assim construído contribui para a definição das políticas públicas educacionais e para a necessária continuidade administrativa. Metas e objetivos são definidos e avaliados para períodos que transcendem a duração dos mandatos dos cargos públicos, executivos ou legislativos. O projeto da escola pode ser pensado, por exemplo, para 2 a 10 ou mais anos, dependendo da capacidade dos seus segmentos e de sua comunidade de resgatar as experiências instituídas, considerar as vivências do presente e de pensar o futuro.


O caminho aqui sugerido procura contribuir com a construção da autonomia da escola, dos educadores e dos educandos como agentes curriculares e, numa dimensão mais ampliada, com a autonomia da própria sociedade. Construir o PPP da escola, na perspectiva da Escola Cidadã, implica a construção do projeto de uma sociedade que, dessa forma, pode ir também se tornando mais bela, prazerosa, aprendente; enfim, mais justa e solidariamente humanizada.


BIBLIOGRAFIA


ANTUNES, Ângela. Leitura do Mundo no contexto da planetarização: por uma pedagogia da Sustentabilidade. Tese de doutoramento. São Paulo, FE-USP, 2002.
_____. Aceita um conselho? Como organizar o Colegiado Escolar . São Paulo, Cortez/IPF, 2002).
_____. & PADILHA, Paulo Roberto. Projeto político-pedagógico, leitura do mundo e a Festa da Escola Cidadã. São Paulo, Instituto Paulo Freire. 2002. (mímeo), 13p.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo, Paz e Terra, 1997.
 
 
 

sexta-feira, 1 de julho de 2011

Na faculdade, conteúdo do ensino fundamental

Na faculdade, conteúdo do ensino fundamental

Instituições de SP fazem reforços paralelos até de tabuada para aluno poder acompanhar a graduação -
Isis Brum - Jornal da Tarde




Os cursos de reforço ocorrem, geralmente, uma hora antes do período normal de aulas, no caso do noturno, ou uma hora após o expediente escolar, para quem  estuda pela manhã. Nesses módulos há estudantes oriundos do sistema particular de ensino, mas a maior parte dos estudantes, dizem os professores, é formada  por gente vinda da rede pública. Um deles é Evânio Viana Nobre, de 42 anos, que cursa o último ano de Licenciatura em Matemática na Universidade de Guarulhos  (UnG), na Grande São Paulo. Ele diz que, na primeira vez em que tentou cursar o ensino superior, abandonou a faculdade. “Tive de contratar um professor  particular”, lembra. Na UnG, participou do Mathema, o cursinho extra de matemática.

“Os alunos chegam sem noção alguma da serventia do conteúdo para a vida dele. Falta significado”, diz Ana Maria Pires, professora do Mathema. Mayara  Elza Lessa, coordenadora de Inserção Acadêmica da UnG, acredita que as dificuldades em leitura e produção de texto são graves. “Por isso, criamos o  laboratório de produção textual.”

“O ensino público está muito ruim”, critica Magali de Paula, professora do projeto Aprimorar do Centro Universitário Sant’Anna (UniSant’anna). “Os alunos  chegam à instituição semianalfabetos”, completa. Por lá, o cursinho extra também inclui reforço em espanhol e inglês.

As instituições particulares já perceberam que precisam resolver as deficiências da educação básica de seus ingressantes se quiserem mantê-los nas aulas.

“Esse é o nosso público. E ele também tem direito de cursar a faculdade”, afirma Rodrigo Capelato, diretor executivo do Sindicato das Entidades Mantenedoras  de Estabelecimentos de Ensino Superior no Estado de São Paulo.

“O diploma da educação superior tem implicações sociais. Felizmente, algumas universidades estão olhando para isso e oferecendo os cursinhos”,  avalia Ocimar Alavarce, professor da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP).

Nas faculdades do Grupo Anhanguera, as oficinas ocorrem especialmente no primeiro ano e ajudam o aluno até a pesquisar na internet. “É, sim, um  desafio, mas cabe a nós ajudar esses alunos a realizar o seu projeto de vida”, diz Ana Maria Souza, vice-presidente acadêmica da Anhanguera Educacional.

Na  UniRadial, instituição do Grupo Estácio, o cursinho de reforço é oferecido a distância, durante a formação regular.

A Universidade Anhembi Morumbi também adota a técnica e os módulos são criados de acordo com a necessidade das turmas, segundo a pró-reitora  acadêmica da instituição, Josiane Tonelotto.

“Aqui, combinamos competências e habilidades (defasadas) com a aquisição de novos conhecimentos”, conta Sílvia Ângela Teixeira Penteado,  pró-reitora da Universidade Santa Cecília (Unisanta), na Baixada Santista.

Os números mais recentes do Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo (Saresp) ajudam a entender as dificuldades do aluno que chega à  universidade: quase 60% dos alunos do ensino médio estão abaixo do nível básico em matemática e 38% deles não absorveram conteúdos mínimos em português.

Isis Brum - Jornal da Tarde

Fonte: http://www.estadao.com.br/noticias

segunda-feira, 27 de junho de 2011

Gestão Escolar - Diferencial para uma Educação de Qualidade





Gestão Escolar - Diferencial para uma Educação de Qualidade

Qual é o profissional mais importante para que se efetive em termos práticos a educação de qualidade que todos almejam? Se sua resposta foi o professor, tenha certeza que ele também é fator decisivo, verdadeiramente primordial para que isso aconteça, mas por incrível que pareça, pesquisas conduzidas no Brasil e no mundo têm atestado a importância maior dos gestores escolares para que se efetive um trabalho realmente qualificado nas salas de aula de qualquer localidade.

Investimentos na formação dos gestores são, conforme dados da Fundação Lehman, normalmente muito mais eficazes para alterar positivamente o rumo dos acontecimentos no âmbito escolar que qualquer dinheiro investido no aperfeiçoamento dos docentes. E isto numa base matemática equivalente a 5 vezes mais resultados favoráveis para cada centavo gasto com gestores do que com educadores.

No entanto, a maior quantidade de recursos públicos investidos na formação de profissionais das redes municipais, estaduais e federais é vertida em bases inversamente proporcionais em cursos e atualizações para os professores, com a carga destinada a gestores sendo bastante reduzida.

Simplificando este raciocínio podemos afirmar que se gasta muito mais com professores para sua especialização, aperfeiçoamento e atualização do que com gestores da educação, como diretores, coordenadores, orientadores e mesmo o staff que gerencia as redes públicas municipais e estaduais em nosso país. E, como complemento, concluir que o dinheiro gasto com os gestores representa mais benefícios para as escolas do que qualquer investimento feito em relação aos professores.

Isto quer dizer que os investimentos na formação de professores devem acabar e, em substituição a estes o dinheiro deve ser revertido para o aperfeiçoamento dos gestores?

Não é isto que estamos dizendo e defendendo neste artigo... Acreditamos que ambos os grupos de profissionais da educação, gestores e professores, são importantíssimos para que se efetive no Brasil uma Educação de Qualidade.

Para que isto aconteça cremos ser necessária a continuidade de investimentos para a formação dos docentes, mas advogamos em prol de maior dispêndio em relação aos gestores nem que, para que isto aconteça, se divida melhor o manancial de recursos destinados a esta finalidade formativa.

Não há dados exatos quanto à partilha dos investimentos relativos à formação dos profissionais da educação, mas certamente aos professores é destinado percentual que supera – com larga vantagem – o custeio de cursos e atualizações para os gestores. Seria sensato crer que, em termos de dados numéricos, a vantagem seja de 8 e até mesmo 9 reais investidos nos professores para cada 1 ou 2 reais destinados aos gestores.

E como estou apresentando uma informação pautada apenas no exame superficial de dados relativos aos gastos de alguns municípios e estados brasileiros quanto a investimentos em novas tecnologias e metodologias de ensino aplicadas às escolas, normalmente envolvendo formações destinadas a professores, e verificando que aos gestores há muito menos opções, a situação pode ser ainda pior do que a mencionada...

Mas por que, de repente, se sentiu a necessidade de reforçar as bases da ação dos gestores escolares, dando-lhes mais subsídios com estas formações e atualização de conhecimentos?

Para melhor entender esta questão é importante primeiramente identificar o perfil dos profissionais que atuam na gestão de nossas redes e escolas públicas (assim como também nas particulares). Neste sentido, vale destacar que normalmente quem é alçado a condição de secretário de educação, diretor de escola ou coordenador pedagógico, por exemplo, na maioria dos casos é um destacado professor que teve seus esforços em sala de aula reconhecidos por alguém hierarquicamente superior ou por seus colegas de escola ou rede.

É, portanto, algum profissional graduado em pedagogia ou em licenciaturas (matemática, letras, história, geografia...) que tem qualidades tais quais: liderança, organização, conhecimento de educação, capacidade de inovar, carisma, habilidades comunicativas e respaldo entre os colegas e os estudantes. Por vezes todas estas características podem ser encontradas num professor que se tornou gestor, mas na maioria dos casos, estes profissionais possuem algumas destas qualidades e não todas.

O problema maior reside no fato de que estes profissionais, mesmo levando-se em conta todos os seus méritos e qualidades, passaram por formação universitária deficiente, que não lhes legou possibilidades e ferramentas necessárias e suficientes para se tornarem gestores. São pessoas que conhecem educação, suas escolas ou redes, comunicam-se bem, são relativamente organizadas, têm perfis de líderes, mas que não tiveram acesso na universidade a cursos especialmente devotados à gestão de instituições, públicas ou privadas, de ensino ou de qualquer outra área de atuação.

Não basta ser carismático ou ter evidentes características de liderança... Os gestores precisam organizar dados, ler as informações disponíveis e analisá-las para definir prioridades e prerrogativas, delegar funções, cobrar efetividade de seus comandados, reunir e administrar reuniões, lidar com prazos e urgências, relacionar-se com diferentes públicos e necessidades (professores, pais, funcionários, alunos...), planejar e definir metas, gerir de forma participativa e democrática o seu reduto educacional, conhecer legislação específica e geral, administrar recursos financeiros públicos...

Tudo isto exige, certamente, preparo e adequação que não são componentes da formação universitária destes profissionais e, encontrar as respostas no cotidiano leva a reutilização de práticas já usuais no setor ou de definição de ações a partir do senso comum, desprezando-se as técnicas de gestão necessárias e fundamentais para esta finalidade.

Não se despreza com este posicionamento tudo aquilo que os profissionais que atuam na gestão escolar possuem de conhecimento e experiência, mas espera-se que se constate a necessidade de adicionar a todos os saberes anteriormente adquiridos na academia ou na práxis as informações e ações relacionadas à administração de instituições de acordo com os ensinamentos provenientes de especialistas em administração.

O que se pretende com esta constatação é, apenas, concluir como necessário que o capitão do navio conheça não apenas todas as prerrogativas e ações próprias de seus marujos, mas que saiba como dar rumo, evitar motins e rebeliões, organizar as ações de seus comandados em comum acordo com eles (mas fazendo valer sua posição e opinião), respeitar os prazos de partida e chegada, prover com os necessários recursos os passageiros e os tripulantes...

Tudo isto para que, no final, a viagem tenha sido bem sucedida, com o mais elevado nível de satisfação tanto dos clientes internos quanto dos externos, ou seja... Atingindo os melhores resultados possíveis... Se não é fácil diferenciar o capitão do navio de seus tripulantes, como então seria possível realizar a melhor viagem como desejado? Nas escolas não é diferente...

João Luís de Almeida Machado Doutor em Educação pela PUC-SP; Mestre em Educação, Arte e História da Cultura pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (SP); Professor Universitário e Pesquisador; Autor do livro "Na Sala de Aula com a Sétima Arte – Aprendendo com o Cinema" (Editora Intersubjetiva).

Fonte: http://www.planetaeducacao.com.br/portal

terça-feira, 14 de junho de 2011

A Educação e a inversão de valores - Marcelo Luis dos Santos Antonio - Diretor de Escola, Biólogo, Especialista em Gestão Escolar pela UNICAMP.




A Educação e a inversão de valores - Marcelo Luis dos Santos Antonio - Diretor de Escola, Biólogo, Especialista em Gestão Escolar pela UNICAMP.

Foi-se o tempo em que a escola apenas cuidava dos saberes acadêmicos... Foi-se o tempo que a maior preocupação de todo educador era se o seu aluno estava aprendendo... Foi-se o tempo que cada segmento da sociedade dava conta (ou pelo menos tentava) de suas responsabilidades.... Foi-se o tempo...

Hoje, essas responsabilidades foram delegadas unilateralmente à instituição escolar. A princípio, essas competências delegadas estavam alicerçadas na competência histórica da escola que, de um modo ou de outro, sempre dava conta de seu papel dentro da sociedade, por vezes um tanto distorcido pelas políticas temporais e, por vezes, acertado pelas ações de nossos educadores.

Mas com o tempo isso passou a ser um processo “osmótico”, algo como “passa a bola para escola que ela resolve”.

Hoje a escola, além de seu papel educacional (gerenciadora da construção do conhecimento do aluno), abraçou o social, o judicial, o psicológico, o terapêutico-familiar, não mais como uma parceira dos vários segmentos da sociedade, mas sim, atuando em seu lugar, muitas vezes.

Todas as mazelas sociais, frutos das políticas hipócritas e desastrosas (em todas as áreas), têm na escola o fármaco ideal. A escola se tornou a porta de entrada de um número incontável de programas sociais (como o bolsa família) e passou a ser a “tutora” de menores que cometeram atos infracionais e que estão cumprindo medidas socioeducativas.

Sob o enfoque das benesses sociais, a escola não pode se tornar prisioneira de uma política assistencialista, que não enxerga a escola como um processo, mas sim e simplesmente, como um meio. O simples fato de associar a matrícula e a frequência escolar como o “start” ao programa social banaliza a importância educacional da escola, pois um grande número de famílias que são beneficiadas pela “bolsa família” só procuram a escola quando ocorre um problema no recebimento do benefício. Não há, em momento algum, um direcionamento pedagógico, um mecanismo de construção da consciência cidadã.

Já na questão de “tutora” de menores infratores, a escola transita entre o utópico e o real. O utópico, pelo fato de se pensar que os órgãos das áreas competentes (área judicial, social e médica) irão dar suporte à escola para gerenciar os efeitos dessa inclusão no cotidiano escolar, pois a realidade tem mostrado que os segmentos da sociedade que deveriam dar suporte à ação educativa da escola, simplesmente lavam as mãos e se esquecem da “parceria”, daquilo que lhes compete. O real, pois a escola está sozinha nessa caminhada. O que se observa é a ingerência desses “órgãos competentes” no cotidiano escolar é de transferir as suas responsabilidades aos gestores escolares.

Se todos os segmentos da sociedade, incluindo-se aqui os Poderes Públicos e Privados, dessem conta de suas responsabilidades sem delegar, muitas vezes sem a querência da instituição escolar, ela (Escola) poderia concentrar todas as suas ações, entre elas as Parcerias, nas questões estritamente pedagógicas e, naturalmente, sem que fosse algo imposto pelas inversões de valores ocasionados pelo fluxo social esmagador. A escola poderia, de fato, ser uma grande parceira nas ações sociais e preventivas.

Quando será que a Educação no Brasil deixará de ser apenas plataforma de campanhas políticas hipócritas?

Fonte: http://www.planetaeducacao.com.br

domingo, 12 de junho de 2011

Tecnologia - Escolas plugadas - Educar para crescer

Escolas plugadas

A informática faz parte do cotidiano das crianças e dos adolescentes e o governo promete torná-la universal nas escolas públicas até 2010. Conheça a experiência de quem aprendeu a usar o computador como aliado – e o alerta do que não funciona.


Foto: Luis Motta

Google, blogs, Orkut, wikis, hackers... Se alguém ainda tinha dúvidas, esqueça: o dicionário da educação (em casa e na escola) foi definitivamente invadido por novas palavras, criadas quase todos os dias para dar conta do turbilhão de avanços da tecnologia, que criam situações e possibilidades inteiramente novas.
O computador chegou para ficar – muito antes que alguém saiba com certeza se os recursos da informática trazem ou não benefícios concretos para a aprendizagem. Nas escolas particulares, a experiência já soma duas décadas, mas seu uso é cada vez mais diversificado. Na rede pública, as promessas são alentadoras: até 2010, o Ministério da Educação pretende levar computadores a todas as escolas públicas brasileiras, atingindo 55 milhões de alunos.

Nesse mundo novo, no qual se movem com familiaridade crianças e jovens, os adultos estão à procura de um manual de instruções. Os pais temem perder o controle sobre os movimentos dos filhos, que passam a encontrar os amigos em um espaço de relações virtuais. Os professores oscilam entre a negação do avanço e a busca por um novo papel, tentando entender o que é educar em um contexto no qual os alunos têm mais domínio sobre a ferramenta que eles próprios. “Estamos ainda na infância das possibilidades do uso da tecnologia na educação”, diz a professora Afira Ripper, da Faculdade de Educação da Unicamp, pioneira nas pesquisas nessa área.

Para ela, um dos vícios de origem do uso da tecnologia, que ainda persiste, é a premissa de que basta existir o computador e o aluno faz o resto. “Uma idéia na cabeça, um computador na mão”, lembra, parodiando a frase do cineasta Glauber Rocha. Como conseqüência desse pensamento, as escolas que mais cedo se lançaram no mundo virtual colecionaram experiências de fracasso. O impacto sobre o aprendizado foi muito menor do que se previu.

O primeiro erro foi capital: em quase 100% dos casos, o investimento em máquinas veio antes da qualificação dos professores. O que faz a diferença, descobriram a duras penas os educadores, não é a qualidade do software ou do hardware utilizado, mas aquela peça que fica logo à frente do monitor: o ser humano. Projetos bem-sucedidos de uso da tecnologia têm como característica comum professores que compreenderam o novo papel que desempenham como orientadores, motivadores, referências de um processo de descoberta coletiva. Nessa condição, nem é preciso que sobrepujem os alunos no domínio do computador. Basta que saibam o que querem que as crianças aprendam.

Os sucessivos percalços minaram a confiança nas tecnologias de informação e comunicação (TICs). Não demorou para que sua eficácia começasse a ser questionada com dados. Apenas em 2008, duas pesquisas brasileiras ligaram a utilização do computador a defasagens na aprendizagem. Na Unicamp, o pesquisador Thomas Patrick Dwyer cruzou os dados obtidos pelos estudantes no Sistema de Avaliação do Ensino Básico com hábitos de uso do computador e chegou à conclusão de que passar muito tempo diante do micro é prejudicial.


O estudo apontou queda de até 7,5% nas notas dos alunos do atual 9o ano do ensino fundamental (antiga 8a série) e do 3o ano do ensino médio que recorrem à informática para fazer trabalhos escolares ou a lição de casa. Outro levantamento foi feito pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais, o respeitado Inep, vinculado ao Ministério da Educação. A pesquisa sugere que escolas que usam o computador sem conexão à internet têm notas mais baixas nas avaliações oficiais. O desempenho melhora se os micros estão plugados na rede, mas a semente da dúvida foi lançada.

Irritação. É essa a reação dos defensores do uso da tecnologia na escola diante de estudos como esses. “Há alguma convicção científica de que o lápis, comparado com a pedra lascada, propicie maior aprendizagem?”, ironiza o especialista em tecnologias educacionais Paulo Blikstein, doutorando pela Northwestern University, em Chicago. Para ele, o principal argumento para o uso intensivo das novas tecnologias na educação é que elas já fazem parte do cotidiano de todos. “É complicado julgar o computador como um comprimido que irá resolver todos os nossos problemas educacionais.

Certamente, a questão tem mais a ver com a qualidade da atividade desenvolvida”, acrescenta o pesquisador Leo Burd, do Massachusetts Institute of Technology (MIT).


Fonte: http://planetasustentavel.abril.com.br/noticia


quarta-feira, 8 de junho de 2011

A Educação brasileira: onde avançou e o que ainda falta avançar - Por Celso Antunes



A Educação brasileira: onde avançou e o que ainda falta avançar - Por Celso Antunes


Não temos, infelizmente, o melhor sistema educacional do mundo. Uma rápida análise de como se ensina e como se aprende neste país, de norte a sul, das séries iniciais aos cursos de pós-graduação, destaca que estamos muito distantes da excelência. Se procurarmos comparações internacionais tomando como referência múltiplos índices avaliativos, é fácil constatar que o desempenho do aluno brasileiro revela o ultraje de posições vexatórias e que países bem mais pobres e atormentados por crises mais agudas, ainda assim, oferecem opções educativas mais consistentes e podem olhar o futuro com uma esperança que não pode ser igual à nossa.

Mas nem por isso o Brasil tem apenas mazelas a lamentar. Verdadeiras “ilhas de excelência” emergem em toda parte e, ainda uma vez, a qualidade desse trabalho se manifesta de norte a sul, das séries iniciais aos cursos de pós-graduação e — o que mais impressiona — nem sempre emergindo em municípios mais ricos ou aparecendo nas cidades brasileiras de maior IDH.

Além disso, nunca como atualmente se publicaram tantas obras sobre temas educacionais, jamais a grande imprensa se voltou com a intensidade de agora a resultados do ENEM e fez tantas críticas a desvios de verbas educacionais. Se, entretanto, ainda não temos o vestibular que necessitaríamos, estamos longe de outro no qual a decoreba representava caminho inevitável. Uma fria e sintética análise do panorama educacional brasileiro neste segundo semestre de 2010 traz à tona a clássica figura de um imenso mosaico, com manchas escuras onde se destacam problemas cruciais, mas também indícios e registros prodigiosos de processos e sistemas educativos que servem de magnífica lição, e não apenas para nós, brasileiros.

Entre as marcas negativas, não se pode fugir da certeza de falta de escolas em muitos lugares e, pior ainda, da imensa presença de outras tristemente sucateadas, prisioneiras de recursos materiais indigentes, com salas abarrotadas servidas por professores mal preparados e raramente presentes. Há bem pouco tempo não existiam notas que pudessem expressar esse descalabro e assim as palavras se empalideciam por falta de estatística. Agora que tais índices se apresentam graças ao IDEB e ao ENEM, temos notas que se diluem em decimal e patinam em torno de um 4.0 em escala de zero a dez. Pior que essa situação são os labirintos que se enfrentam para dela sair.

Olhando-se para a parte mais sombria desse imenso mosaico, temos uma escola de mentira, fundamentada pelo descaso e responsável por pífia formação moral e intelectual dos que se rotulam estudantes. Números médios de 40 a 50 alunos por sala são encarados como situação “normal” sem a busca de comparações que nos remetem para 15 a 19 alunos na Alemanha e 20 alunos em Cuba. Para o quadro sombrio dessa realidade existem desculpas — algumas justificáveis, outras nem tanto.

Garante-se que nenhum país da Terra empreendeu, nas últimas décadas, o “salto quantitativo” dado pelo Brasil e que quem em tão pouco tempo colocou tanta gente para dentro da escola não poderia fazê-lo sem alguma perda de qualidade. O argumento é verdadeiro. Efetivamente, pudemos saltar de 30 a 40% de crianças fora da escola de décadas atrás, para quase todas as crianças em sala hoje em dia, e esse gigantesco esforço levou-nos a inventar professores do dia para a noite e criar salas sem satisfatórias condições ambientais. Mas que não se acredite ser essa a única razão. É triste perceber que a Educação neste país foi apenas prioridade em discursos, jamais em ação concreta e que fazer nestes trópicos o que na Coreia do Sul e Irlanda se fez custaria sólida vontade política que jamais tivemos.

Espera-se, porém, que o olhar para as manchas escuras do mosaico não oculte a verdade de que existem também, neste mesmo Brasil, escolas públicas e particulares excelentes, cursos de primeira linha que nada, absolutamente nada, ficariam a dever se comparados com sistemas de educação de excelência incontestável. A certeza dessas admiráveis “ilhas” de exceção que em todo o território nacional se percebe constitui ao mesmo tempo uma afronta e um estímulo. Afronta, porque as razões que as fazem existir são claras, plausíveis e aplicáveis em qualquer lugar desde que exista seriedade e persistência e, portanto, quando não se evidenciam provas cabais de omissão criminosa. Mas não podemos esquecer que essas escolas e cursos de qualidade notável constituem também estímulo para ser apropriados por quem desejar fazê-lo.


As excelentes escolas brasileiras, principalmente públicas, são as que são administradas por educadores, por profissionais que, pelo menos há mais de três anos, estão trabalhando no mesmo lugar e não por cabos eleitorais itinerantes e inconsequentes. Seus professores possuem sempre formação adequada e são periodicamente estimulados a ler, pesquisar, aprender, transformar-se. Por sua vez, seus alunos possuem jornadas de ao menos um pouco mais que as trágicas 25 horas semanais. São escolas em que as estratégias de ensino não se ocultam através de paredes indevassáveis, onde foi descoberto o caminho seguro de se premiar o mérito, onde se criaram “intervalos inteligentes” com alternativas de saberes e, sobretudo, onde aulas não são intermináveis e repetitivos discursos, mas situações de aprendizagem criteriosamente planejadas para promover o protagonismo e a linguagem significativa do aluno, a efetiva construção de novos saberes e o consciente despertar prático de competências diversas.

É essencial que se ressalte que não se está buscando, de maneira alguma, dourar a pílula. Os fundamentos anteriormente destacados foram colhidos em escolas públicas que surpreenderam a todos nos resultados dos Índices de Desenvolvimento da Educação Básica e que contemplaram análise do país inteiro. A surpresa desses números é que tais escolas não apareciam necessariamente em municípios ricos — mesmo quando se toma agora como referência o ENEM e se volta o olhar para escolas particulares, ainda uma vez surgem resultados excelentes em Teresina (PI) e em outras cidades do Norte e Nordeste em intensidade maior dos que surgem em ricas estâncias climáticas, enfeitadas por seus hotéis estrelados. A conclusão parece ser extremamente plausível: para mudar de cor as manchas escuras do tenebroso mosaico de uma Educação falida, sejam elas escolas particulares ou públicas, desta ou daquela região geográfica, existe uma “lição a fazer” e esta não constitui surpresa para quem quer que seja. Ou se faz a lição ou se busca desculpa para uma Educação de ínfima qualidade. Vamos, então, aos passos iniciais desta jornada:

1. Quanto ao(s) gestor(es)
Dirigir uma escola, seja qual for seu nível e característica, é bem mais complexo do que administrar um depósito de ferramentas. Exige que esse gestor saiba o que é educar, atualize-se sempre sobre avanços relativos à cognição e à inteligência, compreenda que não pode existir verdadeira equipe pedagógica sem um Código de Ética que a integre e avalie e, sobretudo, que conheça a fundo qual o verdadeiro papel e o verdadeiro sentido de uma escola, tanto como espaço cognitivo quanto como centro instigador de competências e estimulador da sociabilidade. Em síntese, que seja um verdadeiro gestor e não apenas quem conquistou esse título sem esforço verdadeiro ou quem se autoatribuiu esse mesmo título.

2. Quanto aos professores
Desses profissionais espera-se, como tarefa mínima, que cumpram seus horários e programas, planejem suas aulas e organizem mecanismos eficientes de avaliações significativas. Mais do que isso: que descubram que não existe titulação de validade perene e que, dessa maneira, estudem muito e estudem sempre, discutam e aprendam, abram suas aulas aos colegas para que a examinem e critiquem e saibam aprender com seus pares tudo quanto de essencial um educador maiúsculo precisa possuir. Em síntese, que sejam verdadeiramente professores e não prosaicos “professauros”, repetindo hoje o que dez anos atrás faziam.

3. Quanto aos alunos
Que fiquem mais tempo em aula e que, mais do que dominar informações, descubram conhecimentos e valores. Que saibam verdadeiramente pesquisar, que aprendam a argumentar, que compreendam o que precisam ler e abracem a leitura como instrumento de grandeza e não obrigação, que saibam progredir em sua socialização, em sua leitura do mundo, em seu respeito ao outro, no culto de valores essenciais. Que conquistem uma visão sistêmica e que, tendo de deixar incompleto seu curso, demonstrem nível de eficiência e de capacidade profissional que corresponda ao ponto que alcançaram.

4. Quanto à escola
Não se requer palácios, salas aromatizadas e corredores iguais aos de um hotel cinco estrelas, mas que tenha um mínimo de conforto material, onde alunos podem sempre se sentar, encontrar livros, dispor de computadores, descobrir áreas para pesquisar o meio ambiente e o entorno. Que tenha menos aulas expositivas e bem mais situações de aprendizagem que lhes ensinem a sensibilidade para aprender a conversar e não apenas falar, enxergar o mundo e não somente olhar sem que se aperfeiçoe a sutileza para as descobertas.

5. Quanto às aulas e situações de aprendizagem
Que sejam desafiadoras, propositoras e que estimulem descobertas. Que envolvam o aluno não mais na condição de espectador, mas no papel dinâmico de protagonista de seu processo de crescimento. Que sirvam menos para registrar fatos, mas para acentuar a reflexão sobre estes e que ensinem os educandos a discutir, argumentar e contextualizar o que recebem de seus professores como instrumento para compreender melhor a vida que nos aguarda além dos muros e além do dia seguinte.

6. Quanto aos currículos escolares
Que se priorize qualidade e não quantidade. Que permita ao aluno filtrar e organizar esse verdadeiro tsunami de informações contemporâneas e que ajude os estudantes a estruturar seus pensamentos e se movimentar com segurança no turbilhão de notícias, priorizando o que é essencial para pensar a política como ferramenta de ação e não como abrigo de mentirosos. Que o currículo não mais seja visto como uma pilha de disciplinas independentes amontoadas sem integração, mas como expressão de conquistas racionais indispensáveis para se olhar o mundo e compreender as pessoas. Que não se informe em excesso e que tudo que for ensinado seja explorado em profundidade. O Brasil precisa de um ensino com menor volume de ideias apresentadas, mas estudadas a fundo e aplicadas com vistas ao entorno e sua vivência profissional. Que a vida e sua sustentabilidade possam ser o grande tema curricular, em torno do qual uma eficiente interdisciplinaridade integre teorias e sua prática. Enfim, que nossos alunos aprendam a lidar com o conhecimento.

É evidente que essa breve análise não abriga a pretensão de salvar a Educação nacional. Representa apenas singela opinião de um professor e, como tal, necessita do confronto de outras e da saudável polêmica de possíveis discordâncias. Mais ainda: pretende propor pragmatismo ao PDE e assim se apresenta como tímido rascunho sobre as peças de um mosaico e que sabe não ir além de um primeiro passo, mas que admite que jornada alguma se conquista sem um passo inicial.

Fonte: http://blog.educacional.com.br/articulistaCelso/